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Modelo de Memorial para Tribunais Superiores: Agravo em Recurso Especial (AREsp) nº 1.212.274
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- Bruno Neves
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Agravo em Recurso Especial (AREsp) nº 1.212.274
Relator: Ministro FRANCISCO FALCÃO
Agravante: CLARO S.A
Agravado: ESTADO DE SERGIPE
Excelentíssimo Senhor Ministro FRANCISCO FALCÃO,
Considerando oportuno o momento, conclusão dos autos para julgamento, permita-nos trazer memorial complementar sobre as seguintes questões: (i) A ilegitimidade do Convênio 69/98; (ii) A ofensa à LC 87/96 e ao Princípio da Tipicidade Fechada; e (iii) O conhecimento e provimento do Agravo Interno objeto deste julgamento.
1. Da ilegitimidade do Convênio 69/98
Os Fiscos, longa manus dos Estados Membros, têm nas últimas décadas e em vários casos com o apoio do CONFAZ, quanto à arrecadação das empresas de telecomunicações, agido de forma a prejudicá-las por meio de tributação, via ICMS, de atividades que não configuram como serviços de comunicação1.
A irresignação com o Convênio ICMS 69/98, editado pelo CONFAZ, já declarado não lícito pela STJ, no REsp 402.047/MG2, se dá pelo motivo acima, haja vista que o referido Convênio além de extrapolar a competência que lhe fora atribuída pelo permissivo constitucional, o mesmo fere frontalmente o princípio da legalidade estrita em matéria tributária.
Desse modo, ressalta-se que: (i) não incide ICMS sobre a prestação de serviços acessórios ao de comunicação3; (ii) o enquadramento dado “portas de acesso”4 na execução fiscal se configura como serviços acessórios, sem a qual o serviço de comunicação a época não poderia ser prestado; (iii) independentemente de tais serviços (atividade-meio) serem prestados por empresa cujo propósito seja a prestação de serviço de telecomunicação (atividade-fim), tal fato não autoriza, por si só, a incidência de ICMS-comunicação, pois àquela atividade falta o requisito primeiro de configuração do fato gerador do aludido imposto: a relação comunicativa.
Dessa forma, deixar os Estados Membros cobrarem ICMS de atividades que não aquelas propriamente ditas de comunicação, criando por consequência novas exações sobre fatos geradores não previstos na Lei Maior, com base no Convênio ICMS 69/98, além de contrariar os precedentes da Corte de Justiça, dá àqueles Entes e ao CONFAZ o poder de constituintes originários.
2. Da ofensa à LC 87/96 e ao Princípio da Tipicidade Fechada
Em primeiro lugar, o acórdão a quo ignorou as razões da sentença, quais sejam, a literalidade/taxatividade da LC 87/96, bem como o princípio da tipicidade fechada em matéria tributária, ao asseverar que o juízo de 1º grau não poderia classificar “o serviço de aluguel de portas de acesso como mero serviço coadjuvante ao serviço de comunicação stricto sensu” e que não houve ofensa ao art. 2º, III, da LC 87/96 (e-STJ Fl.1021).
Ora, pela lógica, tudo que não for caracterizado como serviço de comunicação stricto sensu (atividade-fim) e não estiver expressamente contido na lei, por exclusão só poderá ser enquadrado como serviço complementar e/ou secundário (atividade-meio). Desse modo, não há cobrança de ICMS, por não se tratar de serviços de comunicação propriamente dito.
Em segundo lugar, o voto vencido além de reconhecer, de forma equivocada, a ofensa ao art. 2º, III, da LC 87/965, aduz que:
Da análise do conceito de serviços de telecomunicações contido no bojo da Lei 9.472/97 em cotejo com o Auto de Infração, verifico que os serviços de locação de portas de acesso à rede de telecomunicações não se incluem na descrição de Serviços de Telecomunicações, propriamente ditos, constante no art. 2º, III da LC 87/96, isto porque, tais serviços configuram, apenas, meios de viabilidade ou de acesso, preparatórios aos serviços de comunicação. Assim, concluiu-se que tais serviços não tipificam a prestação do serviço em exame, mas são simples etapa necessária à sua implementação, configurando-se como um Serviço de Valor Adicionado (SVA). Consoante o art. 61 da Lei 9.472/97, os Serviços de Valor Adicionado constituem atividades que representam um acréscimo da prestação de serviço de acesso ao serviço já existente de telecomunicações. Assim, tem-se que os Serviços de Valor Adicionado não constituem serviços de telecomunicações e, por esse motivo, estão dispensados da incidência do ICMS. Logo, não cabe ao Convênio 69/98 ampliar as hipóteses previstas na Lei 9.472/97 para englobar as atividades que antecedem e viabilizam os serviços de comunicação, uma vez que prevalece no direito tributário o Princípio da Tipicidade Fechada. (e-STJ Fl.1026)
Em terceiro lugar, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 402.047/MG, sob a relatoria do Min. HUMBERTO GOMES DE BARROS, já se pronunciou pela ilicitude “da dilatação da base de cálculo do ICMS-comunicação implementada pelo Convênio ICMS 69/98”, objeto de toda controvérsia discutida nos autos6.
Ademais, sob a temática do Recursos Repetitivos, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do RESP nº 1.176.753/RJ, firmou-se a seguinte tese jurídica (Repetitivo 427):
A incidência do ICMS, no que se refere à prestação dos serviços de comunicação, deve ser extraída da Constituição Federal e da LC 87/96, incidindo o tributo sobre os serviços de comunicação prestados de forma onerosa, através de qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza (art. 2º, III, da LC 87/96). A prestação de serviços conexos ao de comunicação por meio da telefonia móvel (que são preparatórios, acessórios ou intermediários da comunicação) não se confunde com a prestação da atividade fim processo de transmissão (emissão ou recepção) de informações de qualquer natureza, esta sim, passível de incidência pelo ICMS. Desse modo, a despeito de alguns deles serem essenciais à efetiva prestação do serviço de comunicação e admitirem a cobrança de tarifa pela prestadora do serviço (concessionária de serviço público), por assumirem o caráter de atividade meio, não constituem, efetivamente, serviços de comunicação, razão pela qual não é possível a incidência do ICMS.
3. Do conhecimento e provimento do Agravo Interno objeto de julgamento
Além dos motivos já apresentados acima, consideráveis para a admissão do recurso especial da Recorrente, ora Agravante, verifica-se, também, quanto decisão agravada, os seguintes motivos:
- Não há que se falar em óbice à Sumula 83/STJ, pois a decisão a quo recorrida não se firmou no mesmo sentido da orientação do STJ, como ficou demonstrado pelo REsp 402.047/MG e principalmente pelo REsp 1.176.753/RJ (Tema 427/STJ em sede de recursos repetitivos);
- Também não há que se falar em óbice à Sumula 7/STJ, pois a questão controvertida é meramente de direito, a saber: a subsunção do presente caso (auto de infração lavrado com base nas disposições do Convênio ICMS 69/98) ao precedente firmado pela Primeira Seção do STJ no Tema 427/STJ do referido REsp 1.176.753/RJ; e
- Acerca da nulidade do acórdão dos embargos de declaração, por deficiência de quórum, o recurso especial era o único recurso cabível, ante o risco de capitulação de multa por embargos de declaração protelatórios, consoante expressa previsão do art. 1.026, § 2º, do CPC.
Por fim, ante todas as considerações, a Agravante pugna, respeitosamente, a Vossa Excelência, pela retratação da decisão agravada, para que seu AREsp seja acolhido e, no mérito, seja seu recurso especial julgado integralmente procedente.
Brasília-DF, 29 de fevereiro de 2020.
Bruno Neves do Nascimento
OAB/DF 57.352
Footnotes
MOREIRA, André Mendes e MANEIRA, Eduardo. Direito Tributário das Telecomunicações. TORRES, Heleno Taveira (org.). Da não-incidência de ICMS sobre a habilitação de telefones – ilegitimidade do Convênio ICMS nº 69/98 (em coautoria com Eduardo Maneira). São Paulo: IOB-Thomson: ABETEL, 2004, pp. 631-48. Disponível em: https://sachacalmon.com.br/publicacoes/artigos/nao-incidencia-de-icms-sobre-a-habilitacao-de-telefones. Acesso em 23 fev 2020. ↩
“TRIBUTÁRIO - ICMS - "SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO" - CONCEITO - INCIDÊNCIA - AMPLIAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO - CLÁUSULA PRIMEIRA DO CONVÊNIO 69/98. (...) À míngua de Lei não é lícita a dilatação da base de cálculo do ICMS-comunicação implementada pelo Convênio ICMS 69/98 (art. 97, § 1º, do CTN). 4. Recurso provido.” (REsp 402.047/MG, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04/11/2003, DJ 09/12/2003, p. 214) ↩
Informativo STJ nº 0510. ↩
A título de informação, o conjunto das atividades denominadas “portas de acesso” estão nas páginas (e-STJ Fl.616-618). ↩
Art. 2º, III, da LC 87/96: “Art. 2° O imposto incide sobre: (...) III - prestações onerosas de serviços de comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza”. ↩
Ver, nesse sentido, o acordão recorrido de nº 201621577: “Cinge-se o presente o recurso, portanto, a analisar a possibilidade de tributação do ICMS sobre os serviços inseridos no Convênio 69/98, objeto do auto de infração lavrado pelo embargado” (e-STJ Fl.1024). ↩